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entrevista

Grife brasileira

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Grife brasileira

Com experiência no setor bancário, Jovino Ferrari Jr. se apaixonou pela produção de cachaça e criou marcas de padrão internacional

Por Ney Ayres
      Retratos Germano Lüders e Sidney Paladini

Baiano, Jovino Ferrari Jr. fez sua estreia no mundo em 1970, na cidade de Amargosa, hoje com 37 mil habitantes. Aos 3 anos, mudou-se com a família para Tietê, a 140 km de São Paulo, e ali começou a carreira como empreendedor. Desde pequeno, ele trabalhou não por necessidade, mas por opção, em busca de conquistar sua própria reserva financeira. Começou vendendo sacolé e depois colaborou com um pipoqueiro da cidade, e até como entregador de jornais.

Aos 14 anos, Jovino entrou como menor aprendiz no Banco do Brasil. Prestou um concurso interno e foi aprovado. Efetivado três anos mais tarde, iniciou-se no cargo de escriturário. Anos depois, atuando na área financeira, optou por se especializar em economia. Cursou faculdade, pós-graduação e MBA na área.

Jovino teve o interesse pelo mundo da cachaça despertado por meio da convivência com Fernanda Schaper Ferrari, com quem se casou. A família dela produz cana-de-açúcar para destilarias de álcool e, em menor escala, cachaça.

Com sua visão empreendedora, Jovino começou a pesquisar sobre o mundo da bebida, fazer cursos e se especializar. Essas incursões aumentaram o desejo de produzir uma bebida de excelência, inspirada em seu gosto pessoal por uísque. Mesmo focado em caninhas mais elaboradas, premium, ele não deixou de produzir cachaças de linha em maior escala para atender a demanda do mercado.

Ao longo dessa trajetória, houve a oportunidade de parceria com o cantor e compositor Sérgio Reis para a produção das cachaças Pinga Ni Mim Pantaneira. Em conjunto com a Meia Lua e a Unna, ela integra a gama de rótulos produzidos pelo Meia Lua Destilaria.

Hoje, Jovino é reconhecido como um grande e respeitado produtor de cachaça. Recentemente, ele lançou uma cachaça exclusiva, a Unna Porto, uma extrapremium finalizada em barricas desse famoso vinho português. Confira nesta entrevista a sua trajetória profissional e toda a sua paixão pela bebida símbolo do Brasil.

THE PRESIDENT - Conte um pouco da sua história.

Jovino Ferrari Jr. –

Sou baiano de Amargosa. Moro no estado de São Paulo desde os 3 anos. Meus pais vieram para Tietê em busca de trabalho. Desde pequeno, sempre quis ser empreendedor, conquistar as minhas coisas.  Aos 8, comecei a vender sorvetes, picolés de saquinho, pelas ruas da cidade. Minhas duas irmãs, Adriana e Andrea, e eu batíamos de porta em porta, vendendo o picolé. Eu não precisava trabalhar para sustentar a família. Fazia isso para ganhar o meu próprio dinheiro. Lembro que minha mãe brigava comigo porque queria que eu pagasse os insumos (açúcar, saquinho, frutas), mas eu não pagava. Toda a venda era 100% minha. Coisa de criança. Aquele dinheiro era a minha poupança. E eu gostava de ter minhas próprias conquistas.

E não parou por aí.

Não. Tinha um senhor lá na cidade, o seu João, que era pipoqueiro. Pedi para trabalhar com ele, igual aos outros meninos. Vendia pipoca nos finais de semana e em eventos e festas. Em paralelo, o dono de uma banca me chamou para entregar jornais. E assim fui levando a vida, dos meus 8 aos 14 anos.

Quando surgiu o primeiro emprego formal?

Fui aprovado como menor aprendiz no Banco do Brasil aos 14 anos. E, durante o período em que trabalhei lá, surgiram oportunidades de concursos internos e eu fui atrás. Estudei e consegui ser aprovado. Aguardei cerca de dois anos até concluir os 18 anos e, finalmente, ser efetivado como funcionário do Banco do Brasil.

Como foi a seguir?

Sempre tive grande interesse em conhecer todo o funcionamento do banco. Passei a conhecer os processos, diversas áreas, e fui me identificando cada vez mais com esse universo. Fiz a faculdade de economia e segui na área financeira. Em 1998, surgiu a oportunidade para assumir o primeiro cargo de gerente de contas para atendimento de pessoa jurídicas. Ali passei a atender empresas multinacionais. Foi um salto na carreira. A partir daí, outras oportunidades foram surgindo, tantas que segui na empresa até a minha aposentadoria.

E a família?

Ela sempre foi o meu porto seguro, em todos os momentos e desafios. Todos me apoiam e incentivam até hoje, contribuindo cada um à sua maneira. Só tenho a agradecer.

Como você entrou no mundo da cachaça?

Foi com a família da minha esposa, Fernanda. Eles têm uma fazenda de plantação de cana-de-açúcar destinada a usinas de álcool e alguns tios mantinham, em paralelo a essa atividade, um alambique de cachaça. Isso me despertou imediatamente o interesse. Eles estavam havia um bom tempo no mercado e conheciam muito do negócio. Um ano depois de me casar, em 2009, percebi que ele era grande. Notei, com minha visão empreendedora, que poderia ser ainda maior. Daí veio a inspiração.

Como você, enfim, entrou no ramo?

Tudo começou com a criação da Cachaça Unna. Após um curso na Esalq (Escola Superior de Agricultura Luiz de Queiroz), ficou muito claro para mim que, para produzir algo diferente, eu precisava adquirir barricas novas, e naquela época não tinha esse material disponível no mercado brasileiro.

Você conseguiu?

O primeiro desafio era importar. No curso, conseguimos unir alguns produtores para fazer nossa primeira importação de barricas de alta qualidade. Com isso, em pouco tempo tínhamos uma cachaça nova no mercado, totalmente diferente do que havia. Nesse primeiro lote, importamos dez barricas.

Qual é a cachaça surgida dessas barricas?

No primeiro ano de envelhecimento da cachaça nas barricas novas, percebemos que o produto estava muito semelhante a uísque. Para diferenciar, fizemos um blend da cachaça com diversas madeiras, incluindo algumas nacionais. Assim, criamos a Unna WS, com o apoio do nosso amigo e master blender Marcelo Pardin e da nossa amiga Dinah Ribeiro de Paula. A bebida é um blend elegante de carvalho-americano em duas tostas diferentes (a tosta 2 e a tosta 4), que traz na composição a tradição do carvalho-francês, a brasilidade da amburana e a surpresa do eucalipto, com um toque de canela-sassafrás. O primeiro lote da Unna WS foi lançado na Expocachaça de 2018, em Belo Horizonte.

O que significa o WS?

Foi uma forma de homenagear, com muita gratidão, meu estimado sogro, Werner Schaper, carinhosamente apelidado de Alemão. Ele foi imprescindível para que esse sonho se tornasse realidade. Infelizmente, não chegou a conhecer a Unna. Partiu pouco antes de ela ser lançada.

E a Meia Lua Destilaria?

Em 2019, após a minha aposentadoria pelo Banco do Brasil, decidi ter a minha própria empresa de cachaça, pois, durante o período de aprendizagem com a Unna Cachaça, entendemos que precisaríamos também de outras linhas para atender às demandas do mercado. E comecei a buscar uma opção, algo que pudesse me destacar nesse mercado, tão rico e competitivo.

O que você identificou como diferencial?

A cidade mineira de Salinas, conhecida como a Capital Nacional da Cachaça. Sempre ouvimos falar que Salinas é uma referência na produção de cachaça artesanal. O solo e o clima são propícios para a plantação de cana-de-açúcar e a população é experiente na arte de fabricar e envelhecer uma boa cachaça. Pensei: por que não termos uma cachaça de Salinas? Foi aí que apareceu, em 2019, a oportunidade de aquisição da Cachaça Meia Lua, uma marca conhecida e conceituada. Ela está no mercado desde 1988. Com uma sociedade na época, iniciamos o projeto de ampliação da Meia Lua Destilaria, modernizando e trazendo novos produtos para a empresa.

E o projeto com o Sérgio Reis?

No início de 2020, um dos empresários do Sérgio Reis estava em busca de uma empresa para desenvolver uma linha de cachaças com a marca deles, a Pinga Ni Mim Pantaneira. Tivemos o privilégio de estar no lugar certo, na hora certa. Firmamos a parceria, que já dura quase quatro anos. Lançamos a linha Pinga Ni Mim Pantaneira, composta de cinco rótulos: Jequitibá, Amburana, Bálsamo, Blend (Carvalho e Amburana) e a Reserva do Serjão, um blend de sete madeiras que vale a pena experimentar. Em 2021, lançamos uma edição comemorativa dos 80 anos do Sérgio. Uma bebida envelhecida por quatro anos em barris novos e de uso único de carvalho-americano e depois finalizada em barris que haviam envelhecido vinho do Porto. A produção foi limitada a 1.680 unidades, autografadas pelo Sérgio. O kit vem com duas taças de cristal personalizadas e um livro com a biografia dele. O box Serjão 80 Anos é um produto diferenciado, feito com muito carinho para uma data especial. Vale a pena conhecer.

E os lançamentos?

Para celebrar os 5 anos da Unna WS, lançamos este ano, em 22 de fevereiro, a Unna Porto. Como diz o ditado, tudo que é bom pode ficar melhor. Deixamos a Unna WS maturar por mais dois anos em barris que envelheceram vinho do Porto. Assim nasceu a Unna Porto. Uma edição limitada, com 619 garrafas numeradas. Tivemos uma aceitação incrível. Vendemos quase a totalidade da produção em menos de um mês de lançamento. Já estamos pensando em um novo produto nessa linha. Teremos novidades!

Como está o mercado da cachaça?

Ela é hoje a segunda bebida mais consumida no mercado interno. Perde apenas para a cerveja. Reconhecida como tipicamente brasileira, ela se tornou uma ótima aposta do setor de destilados. Investir em cachaça, principalmente a artesanal, é um negócio com um grande potencial de crescimento. As cachaças premium vêm conquistando cada dia mais consumidores das classes A e B. Hoje a Meia Lua está enraizada pelo Brasil inteiro, mas definimos um raio de atuação em três estados: São Paulo, Rio de Janeiro e Minas Gerais.

Exportação?

Entendemos a importância do mercado externo, mas hoje nosso foco é o mercado interno, que é muito grande. São Paulo tem mais bares do que muitos países da Europa. De qualquer maneira, estamos nos estruturando para em breve fazer uma primeira exportação.

Tem outras iniciativas?

Outro destaque da Meia Lua Destilaria são os rótulos personalizados. O restaurante, o bar, o hotel ou qualquer outro estabelecimento pode ter a sua própria cachaça. Muitas empresas também nos procuram para fazer cachaças personalizadas como brindes para seus clientes. As oportunidades têm sido crescentes nessa área.