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UM HOMEM ELÉTRICO

LUCAS DI GRASSI

Um homem elétrico

Por Marcos Diego Nogueira

O piloto brasileiro Lucas Di Grassi é um grande arauto das corridas de automóvel sem a emissão de carbono

Geralmente uma pessoa agitada, ativa, com uma agenda cheia e um cotidiano recheado de atividades, é quem chamamos de “elétrica”. No caso de Lucas Di Grassi, ele não é só uma pessoa elétrica, mas também alguém que fez da eletricidade um dos grandes motivos de vida. O piloto brasileiro, grande astro da Fórmula E – a competição de monopostos de carros elétricos –, foi apontado como embaixador do Programa da Organização das Nações Unidas para o Meio Ambiente, em 2018. A justificativa: sua atuação em setores que buscam o desenvolvimento da tecnologia da mobilidade limpa. Grande parte do benefício do carro elétrico é não ter a emissão de carbono”, diz. “Imagine se tivermos a maioria da frota que circula no centro de São Paulo elétrica. Isso melhoraria a qualidade de vida de muitas pessoas. Não existe outro tipo de tecnologia, a não ser a elétrica, que resolva o problema.” Di Grassi também cursa Harvard – desde 2019, ele faz um MBA à distância chamado Harvard O.P.M. (Owner and President Management). Gosta de escutar audiolivros quando vai correr ou fazer sauna e no momento está imerso em Nexus, de Yuval Noah Harari. Ele pedala, joga tênis, pratica esportes aquáticos. Também cria conteúdo no Instagram, escreve newsletter no Linkedin, grava podcasts e é sócio de empresas nas quais cuida de eventos como o Zero Summit, que trata da transição energética. Mas a paixão da sua vida, além dos filhos, Leonardo e Beatriz, é a velocidade. Di Grassi preenche seu currículo com glórias como ser vice-campeão de Endurance – incluindo três pódios nas 24 Horas de Le Mans –, além de campeão mundial de Fórmula 3, vice também de Fórmula 2 e ter representado muito bem o Brasil na Fórmula 1. Agora, aos 40 anos, ele se prepara, com uma nova equipe, a Lola Yamaha ABT, para a sua 11a temporada de Fórmula E – a “Fórmula 1 dos veículos elétricos” –, que, além de ganhar cada vez mais admiradores, tem o papel fundamental no aperfeiçoamento das novas tecnologias que veremos nos carros de passeio daqui para a frente. “Fico longe dos meus filhos 150, 200 dias por ano, viajando, entre corridas, testes, simuladores, eventos etc.”, lembra. “Então, quando estou em casa, tento passar boa parte do tempo com eles, para lhes dar a melhor educação possível.” Morador de Mônaco há 13 anos, o piloto falou com THE PRESIDENT diretamente da Espanha, onde testava o veículo que estará nas pistas ultrapassando os 300 km/h a partir de dezembro. Prepare-se: a temporada 2024/2025 começa no dia 7 em São Paulo, na pista do Sambódromo do Anhembi.

THE PRESIDENT _ Como você vê o desenvolvimento da Fórmula E nesse pouco mais de uma década?

Lucas Di Grassi – Talvez seja bem análogo a como eram os computadores e a inteligência artificial em 2011 e como são hoje. A gente também tem uma evolução muito rápida da tecnologia de carro elétrico. Quando começamos, ninguém acreditava nela. Você falava que estava criando uma categoria de carro elétrico e o pessoal dava risada. “Como assim, nem existe carro elétrico!? Ninguém vende carro elétrico.” E a gente dizia: “Não, mas vai vender. É claro que vai aumentar a frota de elétricos”. Foi muito difícil. Houve barreiras técnicas de tecnologia, bateria, construção do carro etc. Além das barreiras de entendimento das pessoas sobre como a tecnologia iria evoluir. Foi um desafio muito grande começar o campeonato, mas logo depois ele pegou tração e tivemos várias montadoras participando: Audi, Mercedes, BMW, Porsche, que está até hoje, Nissan, Jaguar e por aí vai.

Qual é o papel da Fórmula E no processo de eletrificação das frotas de modo geral?

Primeiro, a maior percepção do público, para entender que os veículos elétricos são rápidos e a tecnologia está madura o suficiente para a gente conseguir chegar a 300 km/h e fazer corridas de uma hora. Em segundo lugar, do ponto de vista tecnológico, desenvolver novas tecnologias, que a gente vai ver nos próximos anos.

Que tecnologias da Fórmula E podem ser empregadas nos carros hoje em dia?

Há várias tecnologias específicas, sobre as quais eu posso falar, como o algoritmo que controla a temperatura do inversor da recarga. Mas não vou entrar em detalhes. Basicamente, como a Fórmula E opera no extremo, a nossa recarga hoje em dia é feita em 600 kW. O máximo que está disponível para o carro na rua é de mais ou menos 150 kW. A 600 kW, a bateria de um carro de rua carregaria 100% em menos de cinco minutos.Mas existe um problema: esquenta tanto a bateria quanto o carregador. Você precisa ter um controle térmico e de transferência de potência muito preciso e muito especial, o que gera uma série de problemas. É isto que a Fórmula E faz: vai resolvendo esses problemas. Outro exemplo são os motores que hoje são 100% mais eficientes do que os de dez anos atrás. O motor chega a 98% de eficiência, e o inversor, a 99,5%. Então estamos falando de eficiências tão grandes que, quando construirmos os motores do carro de rua com base na Fórmula E, praticamente não vai mais precisar de refrigeração. Isso vai baratear ainda mais o carro no futuro.

O que você fala para as pessoas que dizem sentir falta do barulho do motor ao assistir a Fórmula E?

Nossa, eu escuto muito isso. E elas têm razão. Na Fórmula E, o barulho do motor é diferente do barulho do motor a combustão. Na verdade, o barulho é perda de eficiência. É uma energia mecânica que você perde para o ar. Quanto menos barulho, mais eficiência. Realmente para quem está acostumado a ir ao autódromo e escutar o motor roncando, a Fórmula E é diferente. Mas a nova geração, que está acostumada com videogame, não sente a falta desse som. Então imagino que isso naturalmente vá se reciclar e evoluir. Existe, inclusive, a discussão sobre se a gente coloca um barulho artificial ou não. No momento, a gente não coloca nada.

Entre as características muito legais da Fórmula E está o uso dos circuitos de rua. Você pode falar sobre os circuitos mais curiosos e os que você mais gostou de correr?

Essa é uma pergunta legal. Houve vários. Teve uma corrida dentro de um parque de Londres, o Battersea, e a gente fez um teste às 4 da manhã num dia de semana, quando não havia ninguém. Era preciso testar para saber se o carro conseguia passar nas ondulações e curvas. Deu certo. A corrida foi muito bacana. A gente correu também na Suíça, que baniu o automobilismo depois de um grande acidente em Le Mans. A primeira corrida depois disso, depois de 54 anos, foi da Fórmula E nas ruas de Zurique. Ganhei a prova! Então, se você olhar os vencedores das corridas em Zurique, o penúltimo foi o (Juan Manuel) Fangio e o último eu.

Em que ponto se encontra o circuito do Anhembi nessa galeria?

É um circuito bem interessante. Em termos da parte técnica, a infraestrutura está montada. O sambódromo já tem banheiro, área para espectador. Está tudo montado e é uma pena usá-lo uma vez só no ano. Então acho que a corrida no Anhembi é bem característica. A prova é legal. A reta é larga e longa e proporciona uma corrida muito boa.

Existe algum lugar do mundo que seria um sonho percorrer com o circuito?

Existem vários. Fiz o desenho de uma pista superviável em São Paulo. Seria na frente do Parque do Ibirapuera, dando a volta na praça do Monumento às Bandeiras, o “empurra-empurra”, indo até o obelisco e voltando, com a parte do público todo dentro do Parque do Ibirapuera. Também desenhei uma pista no Rio de Janeiro, no Aterro do Flamengo, aprovada pela FIA, com a vista para o Cristo e o Pão de Açúcar. Também seria icônica, já que o Rio não tem mais autódromo. TP