The President

UM CONCEITO

SUSTENTÁVEL

GOURMET

UM CONCEITO SUSTENTÁVEL

Chef executiva do Varanda Grill, em São Paulo, Marina Morales está à frente de uma cadeia de três steakhouses inovadoras, em que se destacam peixes, frutos do mar e até opções veganas no cardápio

Por Ney Ayres              Retratos Germano Lüders  

Assim como um bom prato, Marina Morales é fruto de uma boa mistura. Nascida em São Bernardo do Campo, na Grande São Paulo, a primeira mulher e chef executiva do Varanda Grill tem na família ótimos temperos. Por parte de mãe, descendência italiana e espanhola e, por parte de pai, descendência austríaca, chinesa e espanhola.

Mesmo com o ensino técnico em mecatrônica, sua paixão pela cozinha sempre foi presente. Com a mãe distante do fogão, a influência da avó italiana foi marcante em sua trajetória e projeção profissionais. Sem dúvida, Marina optou pela gastronomia, o que foi um susto para todos. “Todo mundo achava um absurdo”, conta. Mesmo assim, foi atrás do que acreditava e cursou gastronomia no Senac Santo Amaro. 

Até chegar ao comando da cozinha do Varanda Grill, uma das steakhouses mais conceituadas da cidade, com 26 anos de tradição na qualidade da carne, Marina passou por diversos segmentos, como catering, bar de vinhos e até mesmo bufê infantil.

 Mas foi no Chalézinho do Morumbi que se tornou chef executiva. Ali ela chegou a servir 800 pessoas numa noite, a mesma época em que conheceu Sylvio Lazzarini, proprietário do Grupo Varanda Grill e um contato valioso para o seu futuro. A oportunidade de trabalhar no Varanda despontou em março de 2022. Desde então, Marina pilota a steakhouse com maestria e inova com menus especiais, desenvolvidos com certo toque feminino, para atender também os veganos, vegetarianos e clientes mais exigentes que frequentam as três casas. Confira nesta entrevista.

THE PRESIDENT - Conte um pouco da sua história.

Marina Morale  Sou de São Bernardo, e minha família é uma boa mistura. Por parte de mãe, descendência italiana e espanhola e, por parte de pai, descendência austríaca, chinesa e espanhola. Então, tem uma mistura bem grande. A minha paixão pela gastronomia veio da minha avó italiana. Ela sempre cozinhou muito bem, enquanto minha mãe fugia do fogão. Sempre colei na minha avó para aprender. Minha distração era cozinhar. No ensino médio, estudava em uma escola técnica e cursei mecatrônica. Mas gostava mesmo é de gastronomia.

Quando entrou no mundo da gastronomia?

Eu falei: “Vou fazer esse curso técnico para ter certeza de que não é isso que eu quero para minha vida”.  Na época, eu trabalhava como monitora em um bufê infantil. Insisti com a dona para que me deixasse ir para a cozinha, mas ela me achava muito nova para a função. Até que consegui convencê-la. Então tive o primeiro contato com uma cozinha profissional. Terminei o técnico de mecatrônica, mas já falei com meus pais sobre a minha opção pela gastronomia. Minha família é toda das “exatas”. Quando fui escolher a faculdade, falei: “Quero gastronomia”. Todo mundo ficou meio assustado por não conhecer o ramo profissional da alimentação.

Como foram os estágios e os primeiros tempos de profissional?

Na época da faculdade, eu participava de eventos e concursos de gastronomia. Fiquei em segundo lugar no concurso da revista Prazeres da Mesa, que era um concurso em âmbito nacional. O dia a dia da cozinha profissional é muito diferente da teoria e prática da faculdade, mas ao longo do tempo as duas escolas se completaram perfeitamente.

E depois?

Assim que me formei, ingressei em um restaurante francês de vinhos, comecei na inauguração e permaneci por quase um ano. Depois disso, fui para uma empresa de catering, localizada em Santo André (SP).

Era uma empresa de eventos?

Sim. Produzíamos alimentos para eventos e distribuíamos para os espaços em São Paulo. Hoje é a Gil Gondim, da chef Gilmara Gondim. Comecei a fazer pós-graduação no Senac em gestão de alimentos e bebidas e continuei trabalhando nesse bufê até aparecer uma oportunidade de ser chef de cozinha para uma família. Foi uma oportunidade perfeita porque trabalhava de segunda a sexta e podia cursar à noite a minha pós-graduação de gestão de negócios em alimentos e bebidas. A família era de empresários do ramo de produtos naturais. Eles queriam abrir um restaurante no futuro e ali seria um começo para nos conhecermos melhor. Fiquei mais de um ano lá. Na pós-graduação, conheci um dos gerentes do restaurante Chalezinho. Meses depois, surgiu uma vaga de chef de cozinha, me candidatei e fui aprovada para a função. Fiquei quatro anos como chef e depois fui promovida a chef executiva. Fazia toda a parte de criação, desenvolvimento de cardápio e treinamento de equipe e fiz parte do projeto da inauguração da unidade do Itaim-Bibi. Então recebi um convite para trabalhar na hotelaria, algo em que nunca tinha pensado, ser chef de cozinha do Hotel Meliá na Chácara Santo Antônio.

Um desafio

Total. Entrei como chef de cozinha. O Chalezinho exigia muito, não parava, mas com o hotel não foi diferente. Promovia diversos eventos, com 400 quartos e capacidade de duas pessoas por apartamento. Mais à frente, assumi a vaga de gestora de alimentos e bebidas na mesma unidade e fiquei na função ao longo de um ano e meio. Aí veio a pandemia e tivemos que nos readaptar no hotel. Meses depois surgiu a oportunidade de ser consultora e chef executiva do Varanda. Conheço o Sylvio Lazzarini de longa data.

Como se deu o primeiro contato com ele?

O Sylvio Lazzarini fornecia carnes para o Chalezinho e tínhamos muito contato na época. Entrei no Varanda como chef executiva em março de 2022.

Como é o seu trabalho lá?

Cuido do cardápio, da criação, do treinamento da equipe e, também, da introdução de novos cortes de carnes e produtos. O Sylvio sempre quis ter uma chef mulher no grupo. Vim com um olhar mais clínico para detalhes, estética, cardápio sofisticado e mais leve. É uma steakhouse, mas que também agrada ao público feminino, em especial a unidade do Shopping JK.

“Cheguei ao Varanda Grill com um olhar mais clínico para detalhes, estética, cardápio sofisticado e mais leve”

Você veio com a proposta de uma gastronomia diferente?

Exatamente. O foco também se voltou para peixes e frutos do mar. O Sylvio acredita muito na valorização desses produtos. Inovamos em risotos, lançamento de novos pratos autorais, valorização de ingredientes nacionais e na elaboração de menus especiais para datas comemorativas

O que você mais gosta de fazer?

A parte quente. Adoro mexer com cortes de carne, massas e risotos. É mais fácil falar do que não gosto de fazer: culinária oriental e confeitaria.

Você gosta de explorar cortes diferentes de carnes?

Sim. Estamos buscando um consumo mais sustentável, desde a produção animal até a valorização de cortes que, em geral, não são muito valorizados. Estamos sempre fazendo testes com cortes não convencionais, como o brisket, que é o peito bovino. Fora do Brasil, é bem valorizado, mas aqui ainda não. Estamos gostando muito de explorar também o coxão mole, por exemplo, que tem se apresentado como uma opção muito saborosa para carpaccio e steak tartare.

Como são escolhidas as carnes do Varanda Grill?

Sempre trabalhamos com carne Angus, certificada. Somos muito exigentes. Realizamos degustações praticamente toda semana. Na verdade, muitas vezes são até três por semana. Sempre levando em conta o melhor para nosso cliente, desde um corte como o coxão mole até a carne de wagyu, originalmente de procedência japonesa. Temos um parceiro muito criterioso para isso, o Carapreta, que faz toda a engorda do gado.

Você acompanha o processo?

Nossa carne é acompanhada pela Intermezzo, que é o nosso frigorífico. Lá monitoramos da ração que o gado come ao abate, que é realizado em Minas Gerais. Depois selecionamos as partes que vamos utilizar. O valor pela arroba do boi é sempre maior do que os concorrentes pagam porque prezamos muito a qualidade. Contamos com veterinário específico da ABA, a Associação do Angus, que vai até o local garantir a certificação. Depois a carne chega à nossa mesa e ao nosso mercado. Vendemos para o Brasil todo.

Sua cozinha é conhecida por ser rica em ingredientes brasileiros. Quais costuma usar?

Gosto muito de utilizar ingredientes nacionais, valorizando o nosso rico país. Nossas castanhas. Com a banana-da-terra, por exemplo, fazemos um ótimo purê! Usamos também os toletes de palmito e a parte mais nobre da pupunha. Só trabalhamos com peixes inteiros e frescos. Toda a limpeza é feita na nossa cozinha de produção central, que abastece as três casas. Valorizamos muito tudo isso. Também temos uma padaria, onde produzimos nossos próprios pães e sobremesas. Tudo é feito de forma muito artesanal e com a máxima qualidade.

Os doces também são feitos no Varanda?

Quase tudo é feito no Varanda Grill. As exceções são os sorvetes, o doce de leite e pouca coisa mais.

E o menu para veganos e vegetarianos?

Quando entrei no Varanda Grill, não havia a opção vegana, só a vegetariana. Criamos pratos para os veganos, que, dessa maneira, não se sentem excluídos em um jantar com amigos ou familiares e começaram também a frequentar uma steakhouse. Nosso risoto de abóbora, por exemplo, é supercremoso. Uma delícia. Temos também um tartare de grão-de-bico que quem experimenta ama!

Qual é o maior desafio de ser uma mulher chef?

Bem grande. Mas melhorou muito. No começo, era difícil aceitarem uma mulher no comando da cozinha. Comecei muito nova. Entrei na faculdade com 17 anos. Aos 19, já estava formada e correndo atrás do que queria. Sempre soube que 90% da mão de obra da cozinha é de homens. Sempre tratei todos da melhor forma possível, com humildade, que eu acredito ser o atributo principal. Procuro sempre ter uma boa relação com a equipe.

Você também cozinha em casa?

Sim, pois minha cabeça não para de criar. Gosto muito de cozinhar e inovar nos pratos do dia a dia. Na pandemia, eu me especializei em comida lowcarb, de baixo carboidrato, que é o que mais faço em casa. Amo receber convidados e cozinhar para a família.

Como é servir 100 pessoas ao mesmo tempo?

Muita organização, muito preparo. A cozinha tem que ter uma equipe organizada, disciplinada, bem ensaiada, com cada um cumprindo a sua função. Como numa orquestra.