Por Wilson Medeiros
Motivados pelo que a aviação faz ao estudar cada acidente, as empresas poderiam explorar suas “caixas pretas” para evitar erros recorrentes e prevenir fracassos
E se a gente abrisse a caixa preta das empresas que falharam? Esta analogia me ocorreu recentemente, assistindo às notícias de um acidente aéreo fatal, sem sobreviventes. A caixa preta havia sido resgatada e os repórteres afirmavam que, enfim, as causas da tragédia poderiam ser reveladas, a partir da análise das conversas dos pilotos na cabine, das ações da tripulação e dos movimentos da aeronave até o momento da queda.
Ao longo dos anos, testemunhei dezenas de empresas caírem na armadilha de ignorar suas próprias falhas, mantendo uma cultura de aparência em detrimento da verdade. Resultados de curto prazo são priorizados, enquanto se perde a oportunidade de criar um ambiente de resiliência, de estabelecer uma escuta para as causas reais dos problemas e reter o aprendizado a partir de tudo o que deu errado (ou que não deu certo). Quantas empresas e negócios poderiam ter sido salvos e quantos talentos aproveitados, se houvesse uma cultura que permitisse a análise honesta e detalhada dos erros?
Imagine que cada negócio, como um avião, carrega esse arquivo valioso de informações sobre os erros e eventos estratégicos que antecederam seu declínio. Assim como na aviação, onde o estudo meticuloso de cada acidente contribui para evitar futuras tragédias, o mundo dos negócios tem a oportunidade de aprender com as falhas —mas, na prática, essa oportunidade é quase sempre, ou na maioria das vezes ignorada.
Não podemos esquecer que vivemos em uma época em que o sucesso é exibido e comercializado — especialmente nas redes sociais, onde a imagem muitas vezes supera o “balanço” de realidade – reforçando uma cultura de aparência, que minimiza a importância do aprendizado com as dificuldades. Exatamente por isso refletir sobre o fracasso se torna cada vez mais urgente.
O filósofo francês Charles Pépin, autor de “As virtudes dos fracassos”, nos lembra que os erros ensinam lições essenciais, como resiliência e autenticidade, qualidades que, no mundo corporativo, podem prevenir erros estratégicos recorrentes, evitar falências e fortalecer a empresa. Para Pépin, o fracasso não é um ponto final, mas uma encruzilhada que pode revelar quem realmente somos e que temos a capacidade de superar. No contexto empresarial, isso nos leva a valorizar a “caixa preta” de uma empresa, evitando quedas fatais.
Muitos dos problemas corporativos enfrentados hoje — como alta rotatividade de funcionários, mudanças constantes nas lideranças, desafios digitais e perda de clientes —poderiam ser minimizados se houvesse uma maior disposição para entender e aprender com os desacertos. Para evoluir de fato, entendemos que as escolas de negócios e os programas de liderança poderiam jogar mais luz (intensidade) ao estudo de insucessos na gestão empresarial em sua grade curricular.
Imagine o impacto de ensinar futuros líderes empresariais e executivos a refletir sobre erros, a perceber e ouvir os sinais de alerta e a se conectarem com a realidade —não apenas na esfera da produtividade, mas também da cultura organizacional. Estudos de grandes consultorias estratégicas e auditorias globais já demonstram que esse aprendizado traz insights que podem mudar a história de uma corporação, alterando a rota e prevenindo falências.
Uma empresa que não tem medo de olhar para suas próprias falhas, portanto, é aquela que se coloca em um caminho autêntico de transformação. A verdadeira força não está apenas em conquistar ou se manter no mercado, mas em ter uma postura constante de autoavaliação. Isso exige líderes que saibam ouvir e estar presentes (no sentido pleno) sem se deixar influenciar pelo brilho superficial das metas atingidas.
Na prática, se investíssemos ao menos 10% do que a aviação dedica ao estudo de falhas na análise de nossos erros empresariais, poderíamos evitar muitas “mortes” de empresas, além de perdas de empregos e sonhos interrompidos. A mensagem é para que líderes, executivos e empreendedores abracem uma nova cultura de aprendizado. Abrir o histórico de falhas da empresa não é sinal de fraqueza e sim de coragem, em nome de um futuro mais sólido e mais transparente. Em vez de olhar para a caixa preta como um arquivo de defeitos, que tal encararmos com uma forma de elevar padrões de resultados e de inovação?